quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Jovem Ex-Prisidiário e o Desafio da Reinserção Social

Emerson Cristofoli (autor)
Rosana Kátia Nazzari (co-autora)
Os jovens do Brasil entre 18 e 29 anos representam 21.81% dos brasileiros. Parte significativa deles vive em condições de vulnerabilidade social. Problematizar a vulnerabilidade implica em entender a facilidade que alguns indivíduos têm em vivenciar e apreender o delito como produção social. Muitos jovens envolvidos com a criminalidade passam por um período no sistema prisional, representando 58% dos encarcerados. Estes jovens presos, tutelados pelo Estado, sobrevivem em um sistema prisional repleto de problemas organizacionais e contradições com a Lei de Execução Penal. A LEP determina como deve ser executada a pena de privação de liberdade e contempla os conceitos tradicionais da justa reparação e da reabilitação. Neste sentido, a pena é percebida não apenas enquanto punição, mas como fator de reeducação. Entretanto, na prática, a lógica que predomina no sistema penitenciário é o confinamento. A juventude privada da liberdade, vivendo como prisioneira, está próxima da escola do crime e não da reeducação. O jovem ao deixar o sistema penitenciário é denominado de egresso do sistema prisional, termo jurídico relacionado a um modelo criminológico, conectado a modelos de Estado Social, que crê na ressocialização e inserção social a partir da atuação das agências formais de controle criminal. Após aprovação da LEP em 1984, foi implantado no Município de Toledo/Pr o Programa Proegresso que atendeu entre 1984 e 2009, 1615 egressos e apenados oriundos ou não do sistema penitenciário. Neste período observado, os jovens correspondem a 45,38% do total dos atendimentos. Neste sentido, é desafiador acreditar que as políticas de reintegração do ex-presidiário ao convívio social podem amenizar as conseqüências dos danos psicológicos causados aos jovens egressos. Apreender a categoria social do jovem egresso e suas (im)possibilidades de reinserção sugere uma analise sobre sua trajetória social. Desta forma apresentaremos o relato de um jovem ex-detento, que descreve como seu envolvimento com a criminalidade influenciou suas relações sociais.
TRÊS CENAS POSSÍVEIS PARA JUVENTUDE BRASILEIRA.
Juventude Vulnerável:
A categoria juventude como etapa específica do desenvolvimento humano, inserida entre infância e idade adulta, é fato relativamente recente da humanidade. Podemos relacioná-la com a industrialização, enquanto produto das condições e demandas sociais por ela imposta, tendo em vista a generalização do trabalho assalariado e o surgimento de novas instituições sociais.
A concepção de juventude como “momento de transição de um ciclo de vida” está associada ao modo como a Sociologia funcionalista a categorizou para fins de análise – como o momento da integração social, quando os jovens se tornam membros da sociedade. Como a juventude é pensada como um processo de desenvolvimento social e pessoal de capacidades e ajustes aos papéis adultos, são as falhas nesse desenvolvimento e os ajustes que se constituem em temas de preocupação social (ABRAMO, 1997 p. 29)

A discussão acerca da temática “juventude” abrange uma complexa gama de percepções, sendo que nosso foco é recorrer a alguns elementos que sejam capazes de conduzir a uma melhor forma de compreendê-la enquanto fenômeno social, em sua complexidade e múltiplas expressões. Desta forma, pautaremos em que medida a violência perpassa a juventude como etapa da vida e se expressa como um fator determinante da vulnerabilidade juvenil.
O conceito de vulnerabilidade social caracteriza-se por um complexo campo conceitual, constituído por diferentes concepções e dimensões que pode voltar-se para o enfoque econômico, ambiental, de saúde, de direitos, entre tantos outros. Neste sentido, “A violência tem uma estreita relação com o jovem em vulnerabilidade social, seja pela condição de vítima ou pela condição de ator” (ROCHA, 2007, p. 40). Cabe salientar que não se pretende aqui restringir a relação no binômio juventude/violência, mas mostrar que, como condição peculiar da etapa da vida, ela acaba sendo mais intensa.
A violência revelada por meio do Índice de Vulnerabilidade Juvenil – IJC (UNESCO, 2010) envolve dados socioeconômicos (homicídios, escolaridade, acesso ao mercado de trabalho, renda e moradia, entre outros). Assim, a violência não é só crime, engloba fatores como: ausência de escola, pobreza, desigualdade, acidente de trânsito. Ao considerar a violência como um dos condicionantes da vulnerabilidade juvenil, pretende-se, acima de tudo, pontuar no debate um entrave para o desenvolvimento saudável da juventude no Brasil. As drogas, a violência e o desemprego passaram a ser considerados os problemas e as vulnerabilidades sociais máximas de nosso tempo.
Porém, cabe ressaltar que a problemática da violência não está no jovem, mas no contexto social a que está inserido, caracterizado por profundas desigualdades sociais, pelo individualismo exacerbado e pela fragilidade do Estado na garantia da segurança pública. Diante desta problematização das condições históricas e sociais do jovem brasileiro, há outras singularidades que merecem atenção. Os dados, levantados pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) 2008, demonstram que um quarto (1/4) dos brasileiros entre 18 e 29 anos não conseguiu nem mesmo completar o ensino fundamental. São quase nove milhões de jovens sem escolaridade básica . São jovens que têm dificuldade de encontrar emprego porque não têm escolaridade mínima, mas também não continuam estudando porque a idade os empurra para o trabalho. Conforme o texto “Juventude, Violência e Vulnerabilidade Social na América Latina”:
“O acesso negado dos jovens a processos básicos como os analisados restringe a capacidade de formação, uso e reprodução dos recursos materiais e simbólicos; torna-se fonte de vulnerabilidade, contribuindo para precária integração desses jovens às estruturas de oportunidades, quer provenientes do Estado, do mercado ou da sociedade. Ademais, diversas modalidades de separação do espaço e das oportunidades sociais, que incluem segregação residencial, a separação dos espaços públicos de sociabilidade e a segmentação dos serviços básicos – em especial, da educação – concorrem para ampliar a situação de desigualdades sociais e a segregação de muitos jovens. (UNESCO, 2002. P.49)”


Juventude Encarcerada:
Os dados do Conselho Nacional de Justiça (setembro – 2010) demonstram que o Brasil possui o terceiro maior contingente populacional de presos do mundo, com 494.958 mil encarcerados . O sistema carcerário no Brasil possui 1.65 presos por vaga e o déficit é de mais de 190 mil vagas. Deste contingente 275.324 mil presos são condenados e 219.274 mil encarcerados são presos provisórios, ou seja, estão aguardando julgamento. A população carcerária cresce a cada ano, em dezembro de 2005 ela era de 361.402 presos, a média anual de crescimento é de 26.711 presos, acumulando ao longo de 05 anos um aumento de 36,86%.
A faixa etária da população brasileira com a maior recorrência no regime fechado é o público jovem de 18 a 29 anos, eles representam 58%, ou seja, são 257,075 mil jovens encarcerados. Sobre a cor da pele os dados demonstram que 60% dos presos são negros ou pardos e 38% são considerados brancos. Com referencia a tipificação criminal: 22% esta relacionado ao tráfico de entorpecentes, 19% crimes contra o patrimônio sem violência, 12% de crimes contra a pessoa, 1% de estelionato e os demais 46% estão relacionados como outros tipos de crimes. O tempo da pena que cada preso é condenado esta dividido da seguinte forma: 22% até 04 anos, 29% de 4 a 8 anos, 22% há mais de 15 anos, 1% há mais de 50 anos e 26% esta relacionado a outros. (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2010)

Analisando os dados do Sistema Integrado de Informações Penitenciárias – INFOPEN – e sem considerar um exagero, poderíamos supor que muito do investimento de políticas públicas para juventude esta relacionada com a construção de presídios. A partir da associação da vulnerabilidade com a desigualdade social e a segregação juvenil, tem-se conseguido esclarecer cenários das complexas nuances da relação juventude e violência.
Este percentual da juventude brasileira encarcerada sob a tutela do Estado sobrevive em um sistema prisional repleto de problemas organizacionais e cheio de contradições com a lei de execução penal (LEP N.º 7.210/84) que é a Lei que regulamenta a pena de prisão no Brasil. A LEP determina como deve ser executada e cumprida a pena de privação de liberdade e restrição de direitos, contempla os conceitos tradicionais da justa reparação, repreensão pelo crime que foi cometido, o caráter social preventivo da pena e a idéia da reabilitação. Neste sentido, a pena é percebida não apenas enquanto punição, mas como fator de reeducação do transgressor.
Entretanto, na prática, a lógica que predomina no sistema penitenciário é o confinamento de pessoas. Conforme Julião (2009), a preocupação esta voltada para a edificação de penitenciarias com aparatos tecnológicos de segurança, imprescindíveis para evitar quaisquer tentativas de fugas ou desordem. Outro fator característico é a rara atenção na promoção de outras formas de resposta a violência e a criminalidade. O que fica evidenciado é a confiança na eficácia preventiva de longas e severas penas de encarceramento, pois ainda se acredita no poder intimidativo da prisão. A maioria das penitenciarias e cadeias no Brasil mantém seu sistema prisional em situação de precariedade, são péssimas as condições de convivência, estrutura física, alimentação e higiene.
Onde prisioneiros de alta periculosidade convivem em celas superlotadas com criminosos ocasionais, de escassa ou nenhuma periculosidade. A prisão é um duplo erro econômico, na medida em que não reprime a criminalidade e tem alto custo econômico para o país. Quanto às conseqüências individuais da prisão, quando da saída dos criminosos, verifica-se haver um circulo vicioso, pois além de não conter a criminalidade, o sistema carcerário ainda pode ser considerado com uma pós-graduação para o crime. (MADEIRA, 2008, p.20)
Como reintegrar a sociedade o jovem ex-detento que passou um período recluso sobrevivendo em tais condições no sistema prisional brasileiro? Sendo que estes 257.075 de jovens entre 18 e 29 anos representando 58% da população carcerária no Brasil conviveram em prisões com excedentes populacionais “astronômicos”. A superlotação favorece o processo de desumanização, pois estimula a disputa por espaço e incita a violência. A vida no cárcere tem no seu cotidiano a destruição social do jovem, o submete a um ambiente degenerativo, estimulante e reprodutor da violência, sendo pedagógico não para a reeducação, mas para a constituição do comportamento violento. A juventude privada da liberdade, vivendo em cárcere como prisioneira, está constantemente envolto a uma trama de aprendizado peculiar da prisão, estando próximo da escola do crime e não portando, da reeducação.

Juventude Atendida pelo Programa Proegresso:

Os programas de assistência ao egresso e apenado visam à reinserção, através do trabalho, da escolarização e da profissionalização como forma de retorno à sociedade. É parte destas ações a preocupação com a redução dos índices de reincidência. Não importa se as iniciativas são de caráter público ou da sociedade civil, o foco é a implementação da Lei de Execução Penais, desenvolvendo iniciativas de prestação de apoio psicossocial a egressos e familiares; provisão de escolarização e profissionalização; e levantamento de vagas de emprego. Segundo Madeira (2008, p.25): “A atuação dos programas não é significativa em termos quantitativos, mas é crucial para garantir a sobrevivência e possibilitar outras formas de sociabilidade entre pessoas saídas da prisão”.
O Programa Proegresso presta serviços de acompanhamento técnico junto ao indivíduo que sofreu uma sanção penal e cumpre pena em regime aberto, livramento condicional, SURSIS, liberdade vigiada, prestação de serviços à comunidade. Atualmente (julho 2011), o Programa atende à 210 egressos e apenados, oriundos ou não do sistema penitenciário. Os objetivos do programa são:
Proporcionar ao apenado e egresso atendimento individual, assistência jurídica e psicossocial, e oportunizar a formação profissional; Realizar o encaminhamento, acompanhamento e fiscalização da Prestação de Serviço à Comunidade; Desenvolver ações com a família do apenado e egresso no sentido da não reincidência criminal; Inserir a comunidade na participação e busca dos direitos civis, políticos e sociais do apenado e egresso; Possibilitar ao benificiário a identificação dos problemas sociais, para que assuma uma postura crítica e busque alternativas mediante a participação junto à comunidade para a resolução dos mesmos. (CONVÊNIO SEJU, 2010)

Diante dos objetivos e das preposições do Programa Proegresso demonstraremos alguns dados do Catalogo do Acervo Juridico do Programa Proegresso da Comarca de Toledo – 1984/2009 - (DEIMILING, CRISTOFOLI). A proposta é apresentar algumas caracteristicas sociais, econômicas e criminal dos atendidos pelo Proegresso com o objtetivo de pontuar, mesmo que de forma superficial o perfil dos jovens de 18 a 29 anos.
O Proegresso atendeu 1615 egressos e apenados de Toledo e Região. Notamos que a faixa etária de 18 á 29 anos corresponde a 730 usuários, sendo 54 mulheres e 676 homens. Desse total de jovens foram captados 376 casos que fazem referencia ao grau de instrução dos beneficiários, os dados demonstram que: 31,64 % têm o ensino fundamental incompleto; 9,04 % têm o ensino fundamental completo; 19,68% com ensino médio completo; 33,51 % ensino médio incompleto; 0,53% com o ensino superior completo e 3,72 % incompleto, 1,59 % são classificados como sem escolaridade, ou seja, não sabem ler nem escrever.
Os crimes com maior recorrência entre o público jovem atendido pelo Proegresso são: tráfico e consumo de drogas com 16,08% dos casos, furto com 14,78%, roubo 6,7%, lesão corporal com 4,40%, direção perigosa de veiculo em via pública com 4,28%, dirigir sem habilitação com 4,1% , receptação com 4,0% e vale destacar os casos de homicídio com 2,9% dos casos. No quadro das profissões, os jovens declararam durante a entrevista inicial que: entre os homens 23,69% estavam desempregados, 20,65% não souberam informam qual era sua profissão, 7,8 trabalhavam com serviço gerais, 6,5% atuavam como servente de pedreiro. Entre as mulheres destacamos que 30,61% declaram não saber qual era sua profissão, 22,44% estavam desempregadas, 14,28% do lar e 8,1% trabalhavam com diaristas ou domesticas.
Este breve perfil dos jovens atendidos pelo Proegresso demonstra alguns dados que servem como base para algumas reflexões. Sobre a questão da faixa etária de 18 a 29 anos podemos relacionada-la a maturidade, que por sua vez está pautada a diferentes aspectos, não só vinculados a características pessoais, mas ao contexto e às relações sociais estabelecidas. Assim, percebe-se uma inserção social mais precoce em jovens de classes populares, seja no que se refere à vida sexual, à inserção em atividade produtiva, à gravidez precoce, ao envolvimento com o crime ou ao consumo de drogas.
A vulnerabilidade social, a partir dos anos 90, não trilha somente os estratos mais baixos ou abaixo da linha da pobreza; ela é advinda do desemprego e de um capital educacional de poucos anos de estudo. A defasagem existente entre as condições educativas, expectativas de realização e expectativas de inserção no mercado de trabalho explicitam algumas das dificuldades enfrentadas pela maioria dos jovens (UNESCO, 2004).
Dentre as dificuldades enfrentadas pelos jovens, o acesso a postos de trabalho é apontado como particularmente critico, sendo o índice de desemprego entre eles muito superior ao índice entre adultos. Ao considerarmos o indicador profissão, podemos sugerir que estes jovens atendidos pelo Proegresso iniciam a passagem da infância para a juventude precocemente, pois necessitam estar ocupados, seja no mercado formal ou informal, em ocupações lícitas ou ilícitas, sem necessariamente vivenciarem a juventude.
Sobre a questão dos delitos, podemos considerar que o crime é um fato social, pois: [...] criminalidade e desvio não denotam qualidades naturais, mas culturais, uma vez que resultam de processos de definição que se desenvolvem no interior do mecanismo ideológico, pelo qual tem lugar a reprodução da realidade social (BARATTA, 2002, p. 218). Enfim, pensar sobre a responsabilidade de todos na produção do fenômeno da “criminalização da juventude”, fenômeno que tanto assusta, ameaça, limita e inquieta, uma vez que fala de um contexto, aos quais todos, desejem ou não, fazem parte, é pensar o crime como um fato social.



Até aqui investigamos, apresentamos e em certos momentos até problematizamos alguns conceitos sobre a forma como as juventudes em condições de vulnerabilidade social, aprisionadas e egressa do sistema prisional tem sido caracterizada legalmente, politicamente e assistencialmente. No próximo tópico, focaremos nossa atenção diretamente sobre a trajetória de um jovem ex-presidiário.

JOVEM EX-PRESIDIÁRIO
Apreender e problematizar a categoria social “egresso” e suas (im)possibilidades de reinserção sugere uma analise sobre sua trajetória, desta vez não mais o considerando como categoria juridica, mas como parte de grupo social marcado pela passagem pela prisão e, por conta dessa e de outras experiencias, vulneráis em um sociedade excludente.
Apresentarei a trajetória de um (01) jovem egresso que é atendido pelo Programa Proegresso da Comarca de Toledo/PR. A escolha dessa trajetória deve-se ao fato deste jovem estar demonstrando o efetivo interesse em se manter afastado do assim chamado mundo do crime. O jovem egresso (A1) tem 22 anos, foi condenado por seis anos e seis meses de reclusão pelo crime de homicídio Art. 121 do Código Penal, natural da cidade de Toledo PR ele sempre morou nesta cidade. Quanto a sua escolarização ele não concluiu o ensino fundamental.
Ele considera sua família unida, apesar dos pais serem divorciados. Conta que o período em que passou preso recebeu visitas e o apoiaram no sentido de sair do envolvimento com a criminalidade. Fato marcante é o sentimento de vergonha ocasionado nas revistas pessoais em sua mãe quando ia visitá-lo na cadeia:
[...] Nois é bem unido ali, não há de desavenças, apesar de minha mãe e pai serem separados, somo bem unidos”.
[...] Me incentivando pra mim se um cara certo, um cara honesto ali, trabalhador, desde o começo, incentivo, a primeira coisa que a família faz é o incentivo, vamos trabalhar, o cara lá vai te arrumar um serviço, sempre tem um incentivando você”.
[...] só minha mãe ia me visitar, de vez em quando minha irmã, mas meu pai nunca foi. Mas depois que eu sai eu fui falar com ele, porque nunca culpei ele pelo que aconteceu, tipo, você nunca veio me visitar, nunca cobrei minha família por nada, sempre falei ô mãe se você não quiser vir, tudo bem. Porque é complicado, você sabe, tem que passar por humilhação, passar por revista, é complicado né. Colocando a mãe da gente pelada, passando por situação que gente pensou que nunca ia passar”.

Sobre suas experiências com o trabalho, ele relata que sua primeira experiência de trabalho foi proporcionada pelo seu pai, que montou uma bicicletaria para que ele trabalhasse. Porem o fato de ter amigos envolvidos com o tráfico de drogas fez com que ele ficasse dividido entre o trabalho e os amigos. Teve também outras experiências trabalhando com catador de frango e como servente de pedreiro. Relata que esta trabalhando e que sente certa diferenciação de tratamento pelo chefe em relação aos colegas de trabalho. Considera o trabalho importante para mantê-lo afastado do envolvimento com os amigos que cometem atos ilícitos:
[...] comecei na bicicletaria, um ou dois anos. Daí você conhece as amizades, dai tal ali, ai foi me afastando mais do serviço, foi onde eu fui me desviando do serviço, ai foi aquela coisa, conheci os outro pia, mais, mais, mais. Ai quando vi abandonei, ai abandonei, dai fui ali, fui pro crime, passando o tempo, dai quando eles foram presos, eu comecei a trabalhar no aviário, ai trabalhei bastante tempo no aviário, dai passou mais um tempinho assim... eu trabalhava e andava junto com os caras, dai ficava meio dividido, entre o trabalho e os caras, as vezes eu queria estar junto dos caras do que ir trabalhar, dai foi onde que acabei fazendo aquilo ali, fazendo cagada e fui preso”
[...] Estou trabalhando como entregador de móveis, mas já trabalhei como servente, e assim a gente vai indo né”
[...] ah não sei né... tem hora que às vezes acho (o ambiente) muito pesado, ai tem horas assim que a convivência com os caras, ai eles fica meio... vô fala por causa do meu B.O né, ai eles ficam meio assim... não fica... no serviço meu fica um clima estranho cara para falar a verdade assim, os outros me tratam assim ... sei lá”

O jovem relata que a motivação para entrar no mundo crime estava relacionada a um sentimento de inferioridade que começava em casa e acabava com os colegas de escola que eram mais fortes. Desta forma acabou conhecendo pessoas que traficavam drogas e eram temidos:
[...] eu acho que o me motivou, foi que nem te falei no começo, sempre assim esse negócio de não valer nada, sempre os outros se acharem melhor do que você, ai tipo assim, chega uma hora que você que se vinga, fala assim: “esse cara vai ver”. Entendeu? E também um pouco em casa. Porque lá em casa meu pai. Ai ficava no meu quarto se revoltando, querendo conhecer mais esse mundo assim: “ô esse cara tem respeito, ai pra mim eu pensava, eu vou conseguir que nem eles, todo mundo vai me respeitar”. Ai um dia deu uns negocio lá em casa e eu apanhei do meu pai, ai falei que sabe de uma coisa: “vô vaza”!, Dai sai de casa e foi onde que o fulano me ofereceu para ficar na casa dele, ai nesse mesmo dia é que fui conhecer, fui conhecer assim a droga, eu nunca tinha visto droga, nada assim, nem sabia que jeito que era, dai o fulano já era traficante, pegou e passou pra mim um pacote, tinha umas 40 pedras mais ou menos, ai ele falou: “se pega isso aqui e a hora que alguém te pedir é 10 reais cada uma”. E eu peguei aquele negocio na mão e pedi: “mas o que... o que é isso aqui cara?”. Isso é crack. É isso ai que da o dinheiro. Ai eu peguei e olhei assim, aquele monte de papel alumínio tudo embolado ali, o loco, dai comecei a vender, só que aquele dia não ganhei nada, ai peguei e percebi que aquele negocio dava dinheiro”


Parte da justificativa de seu envolvimento com o mundo crime esta relacionado à questão da busca pelo poder e reconhecimento. Na busca pelo domínio das relações com os outros valia de tudo: roubar, traficar e matar. Ser reconhecido como forte, ser o chefe causava uma sensação de estrema satisfação e sentimento de aventura, um verdadeiro “super homem”:

[...] Eu me envolvi mais nisso ai, por causa da questão do colégio, que nem eu cara, por ser mais fraco, os caras mais grande, ai aquilo foi entrando na minha mente assim, que eu precisava ta no meio dos cara, pra mim ir pegando poder
[...] Ai você faz de tudo, às vezes você mata, às vezes você vai dar tiro nos cara, vai bater no outro é assim que você vai conseguindo poder, você vai matar, bater e impondo respeito. Ninguém ali vai estar acima de você, qualquer coisa. Acima de você vai estar somente a policia. Mas ali na rua é você, é você, mais você, não importa, se cara tem um revolver mais potente que o seu, você vai tentar derrubar ele, você sempre pensar em derrubar ele”
[...] Eu vou falar a verdade, eu me sentia bem. Era uma sensação que não tem nem como explicar. É uma sensação assim, que você sabe que em nenhum lugar você vai apanhar. Você sabe que nem um lugar alguém vai falar algum “a” a mais pra você. É sensação assim que você esta por cima de todo mundo, uma coisa assim que ninguém pode com você. Ai coisa fica assim, se um cara vier falar alguma coisa pra você, “eu do um tiro nele”. Você sempre ta com uma sensação que ninguém pode com você. Você ta no poder absoluto, ali é tua área. Eu me sentia forte e poderoso, principalmente quando estava com o revolver na cintura. Eu me sentia igual a “superman”. É uma aventura. É um troço muito loco pra você. A gente sente uma aventura que é só você. Você é que manda naquela aventura”.

O fato de estar envolvido com a criminalidade fez com ele ganhasse vários amigos. Muitos desses estão mortos ou presos. Ele mantinha contato constante com os amigos presos e sua relação de amizade era estabelecida dentro de um universo em que os que não cometiam atos ilícitos eram consumidores de drogas. Esta rede de amizades rendia bons contatos para compra e distribuição da droga. Ter vários amigos é ser reconhecido no meio e ganhar muito respeito:
[...] Tenho bastante amigos e vários já morreram, que nem ali no Jardim Europa foi quase tudo. No período que fiquei preso morreram quase todos. Os que não estavam mortos estavam presos comigo, mais de dez morreram”
[...] Minha relação era ali quando eu estava com eles, antes eu conversa pelo celular com eles ali, ele mandavam fazer uma coisinha pra eles, eu ia... agora mesmo não tenho nenhuma relação com eles ali, o único que mantenho contato mesmo é meu cunhado, que eu considero ele ali, ele é meu melhor amigo, é o único que eu tenho contato”
[...] Ganhei bastante amigos e bastante respeito, onde eu ia, onde eu chegava assim... que eu gostava bastante de festa né, bar, onde tinha bastante movimento, tudo mundo conhecia né, “ô o cara chego” então nesse mundo que eu vivia eu conheci bastante, tipo assim, conhecimento e inimigo você arruma bastante, porque dai você ta querendo impor seu respeito. Amizade você consegue bastante, você conhece bastante. Vamos supor você esta vendendo um quilo de pedra por semana, ai você vai conhecer um cara que já vendo dois quilos, ai você já vai pensar, ô o cara vende dois quilos, ai você já vai querer se esplenhar no cara, pra você vendo os mesmos dois quilo e quere ganha dinheiro igual ele. Ou vende mais, ai você vai quere fazer amizade com ele pra saber onde ele pega, vai quer pegar onde ele pega, para pega mais barato”.

Quando não estava com o grupo de amigos seu sentimento era de um peixe fora d’água. A ausência do mundo do crime naquele momento não fazia nenhum sentido em sua existência:
[...] Dai, quando eu não estava no meio disso ai, eu me sentia meio estranho, porque é dois mundos. Você ta no mundo crime, você trata todo mundo normal, você fica meio assim estranho, ai você acostuma com aquele ritmo, ai fora dele você vai ser uma coisa assim que você perdeu o costume do normal do você estava acostumado. Tipo você esta acostumado ali no tráfico o dia inteiro. Comendo do bom é do melhor, roupa nova, só de marca, então se você sair só um pouquinho fora, você já vai ter que trabalhar e fazer um monte de coisa e tal”

O jovem teve duas experiências distintas no período em que passou preso, há primeira muito cômoda e repleta de regalias. Ele permaneceu durante 21 meses na cadeia pública de Toledo, ali tinha de tudo, menos a liberdade. Já durante sua segunda experiência no Centro de Ressocialização - CDR, prefere nem lembrar muito. Pois conforme relata, a disciplina e as agressões eram constantes:

[...] “quando eu entrei na prisão assim, já tinha tudo os conhecidos. Tinha um X lá, uma cela, era só conhecido meu, o X 5 era só do Europa, todos os caras eu conhecia, então já me senti meio em casa, eu falei pra mim eu to de boa, não da nada, enquanto esperava no coró , uns conhecidos já apareceram na bocuda e falaram que ia morar com eles lá na cela e tal, aquilo pra mim não foi um back (choque). O loco to preso, eu entrei normal, pra mim foi tudo normal, e eu já conhecia lá dentro porque tinha ido visitar um amigo que estava preso quando ainda era menor, não houve choque na minha mente, ai entrei já fui morar com os caras no X lá. Eu fiquei um ano e nove meses aqui no cadeião aqui em Toledo e um ano e pouquinho lá no CDR. Aqui no cadeião foi uva, foi sossegado, normal, aqui nos só não tínhamos liberdade, mulher toda semana, você podia trocar de mulher, ligava pra uma, ai do nada aparecia outra, todo mundo tem celular lá dentro. Lá dentro tem de tudo, só não tem liberdade, por isso que eu falo, porque ninguém quer ir pro CDR, porque o sistema é bruto lá, o dia que cheguei lá, eu tinha o cabelo assim, chegamos lá, apanhamos já, os agentes chegaram de cassetete na mão e já chegaram batendo mesmo, aqui nos vamos mostrar pra vocês quem é que manda mesmo e deram um banho gelado na gente, foram entregando aquelas roupas, aquela pressão psicológica, batendo assim na sua nuca, aquela pressão, aqui vocês vão ter que ficar pianinho, tem que ficar quietinho se não vai pra pancada mesmo, e eu vendo aquilo ali, só que não fiquei intimidado, mas pensei o loco, que lugar loco, ai fomos pra triagem e ficamos trinta dias, mas no segundo dia eu já levei um rebento (surra), me tiraram da cela e me arrebentaram, porque eu não sabia que não podia conversar de noite né, . Lá no CDR se aprende na base da pancada, lá eles não chegam conversando: “ olha preso, aqui você não pode conversar , aqui não pode fazer isso, nem nada, os caras abrem e já saem espancando você, então você já apanha e não vai querer fazer a próxima vez, é aquela pressão psicológica, então você tem que entrar no ritmo, tudo você entra no ritmo, ai você fica ali na triagem que eles falam e fica ali isolado, fica 40 dias isolado, você não sai pra nada, você sai dali pra falar com a assistente social e pedir uma cueca pra sua família, ai você já se adapta ao sistema, ai você tem que seguir o ritmo, aquela rotina apanhando, eu apanhava uma vez por semana, porque era a rotina deles, eles entravam dando geral, lá o cara só tem uma escova de dente, a caneca e a colher, papel higiênico e o sabonete, que tem ficar tudo a vista, para hora que o cara abrir a portinhola ele poder ver, só que lá não tem esse negocio de calma é tudo acelerado. É jogo rápido, se você ficar pra trás você já apanha”.

Ao comentar o destino de quem sai da prisão o jovem coloca duas opções: ou você passa a viver em paz com a sociedade ou fatalmente morrerá ou será preso novamente:
“é o que ta acontecendo hoje ai ô, ou o cara sai da cadeia e aprende alguma coisa la, e que volta e trabalhar mudar de vida, ou o cara vai sai e mata ou voltar pra cadeia, ou vai morrer, entendeu? Mais vai continuar sendo aquele ritmo dele aquilo ali, sempre piorando mais, ou uma hora ele vai cair e se tornar um viciado, ou ele vai sair e um inimigo dele vai matar ele, ou ele vai sair e fazer um assalto e a policia vai pegar ele, ai vai preso de novo, ou ele vai matar alguém e vai ter que se apresentar, tudo isso ai”

Ser um ex-presidiário é carregar para sempre o estigma de quem cometeu algo muito grave perante a sociedade. O fato parece ser que mesmo que ninguém saiba que você já esteve preso, algo sempre o deixará incomodado:
[...] você se vê meio diferente, porque você nunca vai ser igual aos outros. Querendo ou não você quer se sentir bem, querendo chegar e conversar algumas pessoas, só que dai a gente aprendeu conversar de um jeito falando gíria alguma coisa. A gente nunca vai ser igual aos outros assim, da comunidade, você vai sempre ter esse rastro, porque você perdeu tempo na sua vida, no crime e você nunca tem retorno nisso ai. Você só perde. Porque a população sempre vai te olhar de “zoio” torto, como um criminoso mesmo. Por mais que população tente ajudar você, que nem te incentivar qualquer coisa, mas sempre vai ter aquele pensamento por trás. São coisas que eu vejo no dia-a-dia, em todo lugar, no serviço, às vezes você esta andando na rua, ou às vezes chega na loja, os vendedores ficam tudo meio assim. Talvez seja por causa das tatuagens dai a gente não percebe e acaba escapando uma gíria. Só que você não ta querendo falar, só que acaba escapando. Por que se acostumou falar daquele jeito. O cara que foi criminoso tem isso na mente. Ele nunca vai se comparar com outra pessoa. Por que aquilo ta na mente e na mente das outras pessoas também”.

Parece que ser um ex-presidiário não difere de ser um egresso. Mesmo que o Estado através de leis e os programas de atendimento estejam propondo alternativas para o dia-a-dia desses indivíduos existe algo muito forte que marcou suas trajetórias de vida que não permite que consigam superar isso. Quando questionado o que é ser um egresso, o jovem se demonstra indiferente a situação e declara que:
[...] ai que ta cara é foda, eu vou falar pra você, o cara tem que ter mente, se for assim o cara tem que ter disposição, pra sabe pra querer reconstituir a vida dele, por causa que você é tratado diferente, se vê, se percebe, eu percebo, tudo lugar que eu vo, por causa das tatuagens principalmente, você já é olhado diferente, no meu serviço ali é difícil eu ser tratado como os outros, porque os caras no meu serviço ali, o patrão prefere manda o outro fazer uma coisa do que pedir pra mim, o fala pro outro pra ele vir falar pra mim, assim, aquele negocio que sempre fica com o pé atrás, entendeu? Por causa daquilo que você fez. Eles mostram isso na cara deles, não é coisa você fica imaginando, é o que acontece cara, as vezes ele não quer ser rígido ali como ele é com os outros, mas com você ele não vai chegar assim e falar “tem que fazer assim”, ali no meu serviço ta assim cara, ele sempre ta pressionando os caras, mas so que ele nunca vem cutuca eu, sempre vejo, ou seja, ele sempre ta falando pra outro vir falar comigo, mas sempre fica com o pé atrás pra falar comigo, acho que só deu emprego pra mim porque estava precisando muito e também por um amigo meu deu uma força”.



CONSIDERAÇÕES ACERCA DA REINSERÇÃO SOCIAL
O debate sobre a reinserção social do jovem ex-presidiário envolve a questão do tratamento da criminalidade dentro sistema penitenciário e posteriormente seu acompanhamento nos programas de apoio aos egressos. Fato imprescindível nesta discussão é sobre que condições o jovem que cometeu algum ato ilícito retorna ao convívio em liberdade. Recordamos que pena privativa de liberdade não tem somente a finalidade retributiva e preventiva, mas também, e principalmente, a reintegração do condenado à comunidade. Neste sentido é necessário um resgate sobre o contexto histórico do sistema prisional. Foi durante o século XVI que se desenvolveu a estrutura de punição, por encarceramento como modalidade de pena privativa de liberdade, com o recolhimento da pessoa que rompeu com o pacto social a um estabelecimento apropriado ao cumprimento da pena ou não, para refletir sobre seu ato. Segundo Esteves (2008):
O desenvolvimento do sistema prisional, está diretamente relacionado com a história do desenvolvimento econômico, cultural e social das sociedades humanas ocidentais e em consonância com o do direito criminal, uma vez que este, em seus primórdios de institucionalização teve papel relevante no processo de hierarquia social, com a tese da defesa e a manutenção da ordem pública, com ênfase nos bens e do status social do indivíduo. Durante os séculos XVI e XVII, as condições de pobreza, de pauperização e de miséria se expandiram por toda a Europa. A criminalidade passou a ser punida com penas mais severas e de acordo com as necessidades dos detentores dos meios de produção.

O Estado, sob dominação da burguesia emergente, desenvolveu leis mais severas e passou a punir os trabalhadores aptos que deixavam seus trabalhos para mendigar. Nesta trajetória, durante século XIX, teve inicio o desenvolvimento das penas de privação de liberdade, com a construção e criação de prisões organizadas para correção dos condenados. Esses locais ficaram conhecidos como “Casas de Correção”, onde delinqüentes, mendigos e/ou imigrantes eram recolhidos para “reforma” de sua conduta desviante por meio do trabalho e da disciplina. O direito penal sentia a necessidade de reforma para atingir essa população. De certo modo, pode-se dizer que a reforma ou revolução operada no campo do direito penal resultou da imperiosa necessidade de controlar e ordenar os impulsos e as paixões das massas urbanas em fermentação.
Outro fator relevante é a questão econômica que, no referido período histórico é notadamente um dos fatores preponderantes, pois as instituições prisionais, em sua maioria, eram povoadas por pessoas que, inicialmente não apresentam condições de inclusão no mercado de trabalho. Essas pessoas tinham um perfil similar em toda sociedade ocidental, eram em sua maioria migrante, negra ou afrodescendentes, sem alfabetização e profissionalização, cujos delitos, em sua maioria eram contra ordem e a propriedade privada. Desta forma, podemos entender que o sentido da tese, de que é um mito pretender ressocializar o delinqüente por meio da pena privativa de liberdade. A idéia e a pratica da ressocialização, como hoje a conhecemos, ainda não era explicita, mas, ao longo do tempo, foi se tornando cada vez mais presente.
Fato é que em pleno século XXI, a Lei descreve claramente que o objetivo da pena não é o castigo, mas sim sua recuperação, a fim de (re) integrar os criminosos na sociedade. O conceito de punir carrega a seu lado a idéia de reinserção, reabilitação social, ressocialização. A utopia é acreditar que através da execução penal, o Estado pune o infrator e o reabilita para voltar a viver livre coletivamente. Conforme Thompson, apud Julião (2009, p.18):

[...] em seu estudo sobre “a questão penitenciaria” demonstrou que os fins atribuídos à pena de prisão são inconciliáveis e contraditórios, pois a prisão além de não poder deixar de punir, também não recupera ninguém. Compreende que a intimidação, a ser obtida pelo castigo, demanda que este seja apto a causar terror. Para ele, com isso, “tais condições são reconhecidamente impeditivas de levar ao sucesso uma ação pedagógica”. Trabalhando com a idéia contraria à estabelecida ao sistema penitenciário, acredita que “se a adaptação à prisão não significa adaptação à vida livre, há fortes indícios de que a adaptação à prisão implica em desadaptação à vida livre”.

Destacamos que dentro do universo prisional o conjunto social de maior incidência são os jovens e neste sentido é preciso problematizar os desafios e as possibilidades de reinserção . Diante desta trajetória, temos que perceber a juventude como dimensão heterogênea e entender que é fundamental a existência de políticas públicas visando promover a prevenção da marginalização e da exclusão de parcela da população jovem no Brasil, ou seja, criar/aperfeiçoar propostas de prevenção e de qualidade que se preocupe efetivamente com a integração dos jovens e com a ampliação de oportunidades de reinserção social. Neste sentido é preciso que se compreenda a criminalidade inserida no contexto da pobreza e desigualdade social, como resultado de um processo que envolve a classe trabalhadora e que está diretamente ligada aos processos de produção da riqueza na sociedade burguesa.
Porém não estamos dizendo que apenas os pobres praticam atividades consideradas ilícitas, o que queremos explicitar é que por ser uma população excluída de todas as formas de acesso a riqueza socialmente produzida, eles acabam se tornando mais vulneráveis à criminalidade, sendo penalizados e estereotipados. A classe mais abastada também comete crimes, como grandes escândalos financeiros, fraudes nas instituições públicas, os chamados crimes de “colarinho branco”, no entanto além de terem um tratamento diferenciado no decorrer do processo, quem acaba pagando por eles é classe mais subalternizada da sociedade.
No desafio da reinserção social, uma coisa é fato: os jovens têm mais disposição do que qualquer outro setor social para comprometer-se com causas nobres, com ideais, com desafios coletivos. Eles nasceram num Brasil concreto, dos anos 1980 e 1990, imerso em um processo histórico diferente daquelas décadas anteriores, em um mundo que, nas últimas décadas, sofreu transformações de enorme envergadura nos campos político, econômico, tecnológico, cultural e social. O momento atual é histórico e muito indicado para renovar a discussão sobre a juventude e passar de clichês a dados objetivos e análises profundas.
No campo social, a sociedade está colocando no centro da agenda pública a necessidade de priorizar de uma vez a luta contra a pobreza e contra a desigualdade, que tem entre suas vítimas preferenciais os jovens. Tudo isso se reflete nos setores jovens da população. Os "trajetos de vida" são totalmente diferentes segundo o estrato social a que pertencem. Os setores de estratos altos podem aspirar a ter níveis de educação, saúde, trabalho e moradia semelhantes aos de jovens de países desenvolvidos. Por outro lado, os jovens mais pobres vêem sua vida drasticamente marcada pela falta de oportunidades oferecidas pela sociedade. Devem começar a trabalhar com uma idade precoce, suas possibilidades de cursar estudos primários e secundários são limitadas, correm riscos significativos na saúde, não possuem rede de relações sociais que possa impulsioná-los, não há crédito para eles, sua inserção no mercado de trabalho é muito problemática, dificilmente conseguem sair da situação de privação de suas famílias.
Não deixar esvaziarem-se os sonhos da juventude e os seus anseios por um mundo melhor equivale a orientar, incentivar e socializá-la para o envolvimento na esfera pública. Notadamente, os jovens devem ser pensados como atores com os quais é possível estabelecer uma relação dialógica, pois a complexidade do tema violência requer ampliação dos espaços de discussões e pesquisas.

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CASTRO, Myriam de; ET alli. Preso um dia, preso toda a vida: a condição de estigmatizado do egresso penitenciário. Temas IMESC. Soc. Dir. Saúde, v. 1, n2, p. 100-107, 1984
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ESTEVES, Maria Fernanda de Lima. A Eficácia das Penas Alternativas na Redução da Criminalidade. Pontifícia Universidade Católica – PUC/SP, 2008. Dissertação de Mestrado em Direito – São Paulo 2008. Disponível em: http://www.teses.usp.br/ Acesso em: 25 de jun. 2010.

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