POLÍTICAS JUNTO AOS JOVENS NO BRASIL
Rosana Katia Nazzari
Rute Vivian Angelo Baquero
RESUMO: A análise das consequências da globalização sobre a juventude mostra-se distinta nas diferentes regiões e países, a pesquisa pode mostrar em que aspectos ou efeitos das políticas podem e devem intervir em uma forma útil e produtiva. No campo político, apesar dos avanços promovidos pelo processo constitucional, é cada vez maior descontentamento e o sentimento de frustração observado em uma fração significativa da população jovem com as novas democracias. Isto levanta várias questões conjunturais sobre o futuro dos países latino-americanos, bem como sobre as possibilidades de criar regimes democráticos socialmente reintegrados na região. O estudo do tema sobre as políticas para a juventude pode contribuir para definir, a partir de diferentes perspectivas: idade, etapa do desenvolvimento, gênero, etnia e status social, os incentivos a ações estratégicas de políticas pró-activas, tendo em vista o "empowerment" de todos os jovens no Brasil e a resolução de problemas instrumentais, incidindo principalmente sobre os jovens desfavorecidos ou vulneráveis nas diferentes regiões.
PALAVRAS-CHAVE: Capital Social. Empoderamento. Política de Juventude. Brasil.
ABSTRACT: The analysis about the consequences of globalization on youth are very dissimilar in the different regions and countries, research can show, on which aspects or effects policy could and should intervene in a useful and productive way. In the political field, in spite of advancements promoted by the constitutional process, an ever-growing discontent and feeling of frustration was observed in a significant fraction of its youth population with the new democracies. This raises numerous conjectural questions about the future of Latin Americans, as well as about the possibilities of establishing democratic regimes socially reintegrated in the region. The subject of youth policy and to contribute to define, from different perspectives: age, developmental stage, gender, ethnicity and social status. Furthermore incentive pro-active policy strategy, aiming at the “empowerment” of all young people in Brazil and problem solving instrument, focussing mainly on disadvantaged or vulnerable young people in different regions.
KEY-WORDS: Social capital. Empowerment. Youth Policy. Brazil.
I. INTRODUÇÃO
Este estudo tem por objetivo examinar os mecanismos da socialização política que poderiam orientar e contribuir na diminuição da violência urbana e no aumento do empoderamento da juventude por meio de políticas públicas na área da educação, para ampliar as redes positivas de capital social, o bom desempenho institucional e a governança.
Observa-se presentemente, que os jovens utilizam cada vez mais a violência, antes do diálogo, como forma de pressão, para solucionar suas crises e conflitos, bem como no encaminhamento de suas demandas.
Banalizada, a violência passa a ser vista como normal pelas agências socializadoras, normalização principalmente levada a efeito pelos meios de comunicação em massa. Na ótica psicológica, Endo (2006) destaca que, geralmente, o jovem percebe a violência do outro, mas não identifica a violência inconsciente que norteia seu próprio comportamento.
A insegurança e a desconfortável sensação causada pelo medo social levam as pessoas a se retirarem para o espaço privado, distante do espaço público da política. Isto concorre para diminuir os laços de solidariedade e os estoques de capital social nas redes e nas associações de interação pública. O extremo disto é fazer justiça com as próprias mãos, discurso presente no seio das elites brasileiras, que se orgulham de ostentar seus carros blindados, seguranças com técnicas sofisticadas e alarmes monitorados com tecnologia importada.
Sem parcerias privadas os recursos do Estado não são suficientes para fazer frente à vulnerabilidade e a violência. Em razão disso, “para promoverem a superação da vulnerabilidade e de suas conseqüências, em particular a violência, advoga-se o fortalecimento do capital social intergrupal.” A interação com outras instituições, secretarias e ONGs é importante para assim, agregar crenças e valores ampliando os índices de capital social nas escolas e consequentemente, na população juvenil. Desse modo, a construção do capital social pode colaborar com as estratégias coletivas em busca de soluções (ABRAMOVAY, 2002a, p. 14).
Segundo a mesma autora, é necessária a mudança da percepção dos gestores públicos sobre a importância das políticas sociais junto aos jovens, bem como é necessária a percepção, dos administradores das empresas e do setor privado sobre sua responsabilidade social (ABRAMOVAY, 2002b).
Sabe-se que o deslocamento da esfera pública para a privada enfraqueceu de forma substancial, as redes de solidariedade e de confiança social e institucional. Este desgaste nas esferas políticas da democracia está somado aos desajustes no mercado de trabalho do capitalismo, desajustes que coadunam com a ideologia neoliberal da cidadania codificada ou de consumo. Como destaca Misse (2006), os jovens são desmotivados, pelo histórico de exclusão de seus pais e, por essas razões, deixam de procurar espaço e oportunidades no mercado de trabalho e na escolarização.
Neste contexto contraditório, imposto pela pobreza e pela exclusão em conjunto com a ampliação e a sofisticação das novas tecnologias, observa-se o aumento da vulnerabilidade social causada pela violência, pelas drogas e pela ausência de redes sociais e institucionais eficazes para promover políticas sociais e públicas apropriadas e conectadas entre as diversas áreas de atuação do governo (NAZZARI, 2006ª).
A juventude, na vida humana, é um período bastante especial na vida de cada jovem, tendo em vista as mudanças e as transformações envolvidas, ou seja, as diferentes variáveis que influenciam no seu processo de crescimento, de natureza emocional-psicológica, física, biológica e social.
Os jovens são submetidos às pressões dos grupos sociais e assim vão construindo mudanças na personalidade, justamente neste período em que a personalidade tem oscilações entre comportamentos infantis e adultos. O mundo adulto, que antes protegia o jovem quando criança, passa agora a cobrar maturidade, segundo as características físicas recém adquiridas, sem compreender a desigualdade no desenvolvimento do sujeito que ora se apresenta como adulto, ora como criança (PEGO, 2005).
Na passagem da vida infantil para a adulta aparecem os conflitos, pois as cobranças da sociedade se acirram e se faz necessário, ao jovem, tomar iniciativas, ter novas posturas frente a determinadas situações da vida, desligar-se da família, firmar novos laços afetivos, enfim ter responsabilidades individuais, sociais e institucionais.
Assim, esses jovens não encontram, em nossa sociedade, um espaço em que se possam expressar, espaço em que possam exercer seus direitos, tirarem suas dúvidas, verem suas ansiedades sanadas e, ainda podendo buscar respostas para as suas demandas. Eles compõem uma parcela de excluídos sociais, pois sobre eles incidem restrições do ponto de vista econômico, bem como, não possuem representatividade política suficiente, especialmente, no processo de conquista por políticas públicas que lhes digam respeito.
A exclusão e a miséria geram a violência, que hoje é responsável pela terceira causa de morte no país, atingindo principalmente os jovens na faixa de 18 a 29 anos. Os jovens são, ao mesmo tempo, as vítimas e os autores da violência.
Para reverter esse panorama, é preciso que se ofereça aos jovens alguma perspectiva de futuro, perspectiva que tem de começar no processo de socialização na família e, principalmente, no componente de pertencimento a uma comunidade. Imbuída desta lógica, a escola como importante agência de socialização, pode alavancar uma educação que vá além de mero adestramento técnico para uma com salário digno. Enfim, à instituição escola cabe oportunizar o crescimento juvenil em um ambiente saudável, ambiente protegido contra acidentes de homicídio e de trânsito, bem como precavido contra doenças relacionadas à dependência de substâncias psicoativas e comportamentos marginais de risco.
Ações públicas são urgentes, pois, segundo Queiroz, Chaves e Mariano (2001), a população jovem do mundo tem aumentado significativamente, sabendo-se que mais de 85% dos jovens do mundo vivem em países em desenvolvimento e, no Brasil, estão 50% dos adolescentes e jovens da América Latina. Assim faz-se necessário traçar programas eficazes para esta parcela da população.
Os direitos ao atendimento integral aos jovens estão estabelecidos em leis como: Constituição Federal de 1988, Lei Orgânica da Saúde, Norma Operacional de Assistência à Saúde n.o 01/2002, Estatuto da Criança e do Adolescente. Além disso, esses direitos de atendimento integral aos jovens já estão alinhavados no Programa de Atenção à Saúde do Adolescente do Ministério da Saúde. Sabe-se, no entanto, que essas políticas estão sendo implantadas de modo muito incipientes em algumas cidades do país. Alguns programas são contemplados pela urgência em implantá-los, tais como: Programa Atenção ao Adolescente em Conflito com a Lei, ou ainda, são relacionadas aos adolescentes em situação de vulnerabilidade social.
As atividades e as ações desenvolvidas junto aos jovens são realizadas em parcerias com diversas áreas técnicas do serviço de saúde, tais como: saúde da mulher, saúde mental, saúde da pessoa com deficiência, saúde do trabalhador; educação, do esporte e outros. Acredita-se que outro fator que dificulta as ações em prol do jovem e que atrasa ainda mais a realização e efetivação de políticas juvenis está associado à ausência de profissionais com disponibilidade para atuar junto a essa população específica, especialmente no campo psicoterapêutico, terapêutico, educacional e do desporto.
No entanto os jovens podem, porém, contribuir na construção de alternativas para os problemas sociais que enfrentam, especialmente nos países em desenvolvimento. Para isto, é necessário tenham espaços para falar, e reivindicar, e acima de tudo, para ter seus direitos assegurados.
Observa-se que os jovens possuem uma pré-disposição para as atividades comunitárias, no entanto, não encontram ecos favoráveis nas dimensões individuais, sociais e institucionais. Decorre, pois que, possuem baixos índices de capital social e se acham em condição de fragilidade nas redes de cooperação. A fragmentação das políticas públicas juvenis e o isolamento de propostas em áreas e em setores específicos e sem conexão com uma política global de empoderamento estabelecida em parceria com o governo e sociedade civil, essa fragmentação e esse isolamento não permitem vislumbrar uma política efetiva para a juventude no Brasil.
Sendo assim, somente se for construída uma possibilidade de compreensão do meio social, político, econômico, ecológico e cultural é que se poderão promover iniciativas para a melhora da condição juvenil no Brasil. Nesse cenário, este estudo propõe o seguinte objetivo geral: Verificar os desafios das políticas públicas juvenis para promover alternativas que promovam o empoderamento dos jovens brasileiros diante do quadro de vulnerabilidade, de violência e de exclusão social. Para construir as configurações do estudo, como objetivos específicos apresentam-se os seguintes: a) identificar as políticas públicas de enfrentamento para os problemas que afetam os jovens brasileiros; b) elencar os programas relacionados à educação dos jovens no Brasil para empreender políticas públicas de empoderamento;
2. METODOLOGIA
O desenvolvimento deste estudo focalizou-se em duas dimensões; uma seção de natureza teórica e qualitativa, com o aprofundamento dos conceitos: políticas públicas, educação, violência, drogas, juventude, empoderamento e capital social.
Uma segunda dimensão, de natureza quantitativa e explicativa, por meio da análise de dados estatísticos, com o objetivo de examinar a dimensão das políticas públicas para os jovens no Brasil. Ali foram examinados os dados socioeconômicos relacionados ao tema, buscando estabelecer relação entre os conceitos e a hipótese central do estudo. A hipótese central é a de que, sem políticas sociais para a juventude, não será possível criar condições para o empoderamento e a para diminuição da violência, do uso e do tráfico de drogas entre os jovens brasileiros.
3. POLÍTICAS PÚBLICAS JUNTO A JUVENTUDE
As políticas públicas devem ser compreendidas como um conjunto de ações que são coordenadas com objetivo público, envolvendo um diálogo entre o Estado e a sociedade civil na proposição, na formulação, no acompanhamento e nas avaliações das políticas junto a juventude.
A discussão sobre a questão dos jovens e a institucionalização de políticas públicas de juventude só recentemente avançou no Brasil, apesar dos esforços da Organização Iberoamericana da Juventude (OIJ), a partir dos anos 1990, de colocar o tema nas agendas governamentais. “Grande parte desse esforço deve-se à visibilidade conquistada pelos jovens, nos processos de democratização, ocorridos na América Latina na década de 80” (KERBAUY, 2005, p. 193).
Ao traçar um panorama do tratamento governamental dado às temáticas relacionadas aos jovens no Brasil, panorama como se faz neste texto, observa-se que não resultaram, de fato, em políticas públicas, mas num conjunto de programas geralmente desconexos, focalizando grupos de jovens que compartilham determinada condição, tratados quase sempre de forma estereotipada.
Mesmo com a “preocupação mais sistemática dos governos brasileiros, a partir dos anos 1990, em formular e programar políticas específicas voltadas para os jovens”, a mobilização para discutir uma Política Nacional de Juventude somente ocorreu em 2004 e 2005, visando elaborar um “Plano Nacional de Políticas Públicas que contemplasse e aprofundasse as questões que afetavam os jovens e um Estatuto dos Direitos da Juventude”. Os governos, ao conceberem políticas de juventude como políticas sociais setoriais destinadas a determinados tipos e realidades, enfim, ao utilizarem de forma limitada a noção de políticas públicas de juventude, nada mais fazem do que, na verdade, criar políticas de governo, uma vez que nesses moldes, “as políticas de juventude implantadas caracterizam-se por ser reparatórias e compensatórias, em vez de realizarem valores e objetivos sociais referentes ao período juvenil, a fim de promover o desenvolvimento e a construção da cidadania nos jovens” (KERBAUY, 2005, p 194).
Um importante referencial sobre a infância e a adolescência no Brasil é o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Desde sua publicação, em 1990, passou-se a considerar crianças e adolescentes como cidadãos em desenvolvimento, ancorados numa concepção plena de direitos. A juventude não surge, no entanto, nesse contexto, como protagonista com identidade própria, uma vez que parece reforçar a imagem do jovem como um problema, especialmente em questões relacionadas à violência, ao crime, à exploração sexual, à drogadição, à saúde e ao desemprego. A partir dessa concepção limitada, os programas governamentais procuraram apenas, e nem sempre com sucesso, minimizar a potencial ameaça que os jovens parecem representar para a sociedade. Por conseguinte, a construção de políticas públicas de juventude esbarra na falta de uma agenda que inclua, de fato, as temáticas e os problemas juvenis, e que também contemple os jovens como participantes efetivos desse processo, ou seja, das políticas públicas das quais serão beneficiários.
As políticas públicas adotadas, em busca de integrar socialmente o jovem, percorrem como que uma única via de mão única: incentivam programas de ressocialização vinculados à educação não-formal, por meio especialmente da organização de oficinas ocupacionais, da prática de esportes, da arte e de programas de capacitação profissional, “que muitas vezes não passam de oficinas ocupacionais, ou seja, não logram promover qualquer tipo de qualificação para o trabalho” (ABRAMO, 1997, p.26).
Uma análise preliminar da questão-alvo aponta para a construção de programas ordenados tematicamente e executados a partir de determinados critérios de focalização e de seletividade da população. “Nesse esquema, corre-se o risco de confundir políticas de juventude com a institucional idade da juventude, ficando as políticas de juventude fora do contexto ou ilhadas em relação às políticas sociais” (BANGO, 2003, p. 49). Assim para (KERBAUY, 2005, p 198), “[...] poderíamos acrescentar: e produzindo programas de governo e não políticas públicas”.
4. POLÍTICAS DE JUVENTUDE NA AMÉRICA LATINA
A formulação de políticas para juventude na Europa e nos Estados Unidos foi marcante no decorrer do século XX e esteve aliada à criação de instituições governamentais de atendimento específico ao público-alvo. Na América Latina, a preocupação com os jovens e com políticas orientadas para a juventude ganhou destaque a partir da década de 1970, estimulada por alguns organismos latino-americanos e mundiais (tais como a CEPAL e a ONU) e governos europeus (como o da Espanha, que promoveu iniciativas de cooperação regional e ibero-americana). Pesquisas realizadas mostraram que esta preocupação começou antes, na década de 1950, considerada como o momento de inclusão dos jovens aos processos de modernização, por meio de políticas educativas.
Os dados estatísticos mostram que é a partir desse período que se processa a admissão maciça de crianças, de adolescentes e de jovens nos ensino primário e médio, tendo o Estado como instância definidora da formulação e da execução dessas políticas. O investimento em educação foi a principal política para jovens na busca de incorporação social das novas gerações. Na década de 1950, o investimento em educação constituiu um mecanismo importante de mobilidade e de ascensão social. Com o tempo, essa estratégia perdeu importância devido à deterioração da qualidade de ensino. Nos Estados latino-americanos, nesse mesmo período, a ocupação do tempo livre, pelos jovens, era incentivada, criando-se muitas oportunidades para isso, sob o pressuposto de que a boa utilização do tempo faria evitar a adoção, pelos jovens, de condutas consideradas censuráveis, pelo mundo adulto. O foco das políticas para os jovens dirigia-se, então, para a profissionalização, a ocupação produtiva do tempo livre e para a educação dos jovens, atendendo à lógica desenvolvimentista.
O jovem deveria ser incentivado para se tornar um adulto produtivo e com sentimentos comunitários. Nota-se, portanto, “[...] a construção social da juventude como geração a ser integrada à sociedade para a ela servir, priorizando-se na interação indivíduo e sociedade, um modelo ideal de sociedade, ou seja, a norma da sociedade produtiva” (CASTRO e ABROMOWAY, 2002, p. 22).
Segundo Abramo (1997, p. 30), a juventude aparece, neste período, em que os atos de “delinqüência juvenil” extrapolam os setores marginalizados e afetam os setores operários e de classe média, como uma categoria social potencialmente delinqüente, “devido à sua própria condição etária; e as culturas juvenis são sempre vistas como antagônicas à sociedade adulta. Firme nesta posição cabe ao Estado buscar medidas educacionais e de controle para conter a ameaçadora delinqüência”.
No Brasil, os preconceitos são visíveis; basta analisar o Código de Menores, de 1927, cuja proposta era criar mecanismos de proteção às crianças contra perigos e contra as ameaças que as fizessem se desviarem do caminho do trabalho e da ordem. Esse Código de 1927, orientou as políticas para os jovens até sua revogação, no final da década de 70. A tônica da tutela esteve presente também no Serviço de Atendimento ao Menor (SAM), criado em 1941. Posteriormente, “a substituição do SAM, em 1964, pela Política Nacional de Bem-estar do Menor (PNBEM), tendo como organismo gestor nacional a Funabem (Fundação do Bem-Estar do Menor)”, serviu também para consagrar a ideia do jovem, especialmente o excluído, como um ser infrator, que deveria ser reconduzido às malhas do sistema carcerário. “Ao Estado caberia o papel de intervir para garantir o modelo de integração defendido pela sociedade”, segundo Abramo (1997, p. 31).
Na década de 1960, influenciados pela revolução cubana e pelas críticas, em todas as partes do globo, à intervenção norte-americana no Vietnã, os jovens de classe média participantes do movimento estudantil assumiram claramente um perfil contestatório e desafiador ao sistema político (especialmente contra a instalação das ditaduras militares na maioria dos países da região). Os movimentos estudantis e de oposição aos regimes autoritários pautaram-se claramente pela crítica à ordem estabelecida e pela busca de transformações radicais na sociedade. A juventude apareceu então como uma categoria portadora da possibilidade de transformação profunda; e, para a maior parte da sociedade, portanto, condensava o pânico da revolução. O medo aqui era duplo: por um lado, o da reversão do ‘sistema’; por outro, o medo de que, não conseguindo mudar o sistema, os jovens condenassem a si próprios a jamais conseguirem se integrar em funcionamento normal da sociedade, por sua própria recusa (os jovens que entraram na clandestinidade, por um lado; por outro lado, os jovens que se recusaram a assumir um emprego formal, que foram viver em comunidades à parte, como formas familiares e de sobrevivência alternativas etc.). A juventude é entendida aqui não mais como uma fase passageira de dificuldades, mas como recusa permanente de se adaptar, de se “enquadrar” (ABRAMO, 1997, p. 31).
A resposta do Estado à mobilização e à maior participação político-social dos jovens foi a execução de uma contrapolítica ofensiva e violenta de controle policial, visando à total supressão desses movimentos. A imagem da juventude ativa dos anos 1960 e 1970 acabou passando por uma reelaboração positiva e foi apontada como modelo ideal de participação jovem transformadora, idealista, inovadora e utópica, que se vai contrapor à imagem estereotipada dos jovens dos anos 1980, como geração individualista, consumista, conservadora, indiferente e apática. “Uma geração que se recusava a assumir o papel de inovação cultural que agora, depois da reelaboração feita sobre os anos 60, passava a ser atributo da juventude como categoria social” (ABRAMO, 1997, p. 31).
Apesar dessa imagem formada sobre os jovens dos anos 1980, o Estado não cedeu em nada no exercício de seu papel controlador, especialmente ao lidar com jovens pertencentes ou ligados aos grupos surgidos em estratos populares (as gangues juvenis, de punks, as “galeras” de modo geral) e com jovens de vivência e expressão urbanas, principais vítimas da deterioração da qualidade de vida, que atinge principalmente as camadas populares e do empobrecimento da população latino-americana. A preocupação generalizada com aspectos e fatos (isolados) que associam a juventude à violência, ou às drogas, faz multiplicar as proposições normativas visando a disciplinar essas relações. As drogas, a violência e o desemprego passaram a ser considerados os problemas e as vulnerabilidades sociais máximas de nosso tempo.
Diante desse quadro, e a fim de confinar a juventude em uma moldura socialmente confortável, várias políticas de compensação social foram criadas. Ainda que nenhuma dessas políticas tenha sido catalogada como “exclusivamente para jovens”, o foco e a prioridade principal delas foram, especialmente, os jovens oriundos de setores “excluídos”, que apresentavam condutas consideradas delinquentes. O enfoque adotado contribuiu, assim, fortemente para manter, até os dias de hoje, o estigma problematizador da condição juvenil.
5. POLÍTICAS PÚBLICAS JUNTO AOS JOVENS BRASILEIROS
Na década 1990 e início da de 2000, a participação da juventude embora fragmentada, encontrou forças nas organizações do jovem do campo, da cidade e nos movimentos sociais. Frente a esses movimentos reivindicatórios e de contestação, o Estado passa a redigir políticas públicas para a juventude. O esforço generalizado, na década de 1990, para colocar a questão dos jovens na agenda dos governos, leva à criação de vários organismos na América Latina em geral (exceto Brasil e Honduras), organismos voltados exclusivamente para firmar uma política de juventude. A partir da atuação da Organização Ibero-americana da Juventude (OIJ), que alcançou status de organismo de direito internacional, a discussão da questão juvenil passou a ser incluída na pauta de reuniões de chefes de Estado da América Ibérica, e houve um movimento de construir novos e consolidar os existentes organismos nacionais de juventude, por meio da qualificação de recursos humanos, de criação de marcos conceituais e de mecanismos para implementar essas políticas e, com menor êxito, da busca de financiamentos diretos para as políticas de juventude (BANGO, 2003).
O caminho tomado para implantar políticas integrais de juventude tem sido tortuoso e torturante, “[...] tendo em vista a disposição setorial das políticas sociais e a primazia da lógica do serviço sobre a lógica dos sujeitos, em seu desenho” (BANGO, 2003, p. 46).
Por um lado, isso tem impedido a homogeneização dos propósitos desses organismos governamentais (também estaduais e municipais), sua capacitação decisória sobre políticas de juventude e, até mesmo, a participação delas nas instâncias intersetoriais de planejamento das políticas sociais. Por outro lado, faltam políticas que estimulem a participação dos jovens na construção de sua cidadania.
Conspira contra isso a crise das organizações juvenis tradicionais e seus mecanismos de coordenação e, em outros casos, uma inadequada estratégia de aproximação ao mundo juvenil não organizado e aos novos grupos juvenis existentes, devido a um enfoque demasiado “institucionalista da participação juvenil por parte dos governos” (BANGO, 2003, p. 47).
No Brasil, o tema da juventude, introduzido na Assembleia Nacional Constituinte de 1988, ao ser encaminhada a Emenda Popular “Criança Prioridade Nacional”, resultou na criação, naquele mesmo ano, do Fórum Permanente de Entidades Não-Governamentais de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, que culminou com a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em 1990. O ECA, que muito contribuiu para garantir os direitos e deveres da criança e do adolescente, ao incorporar o conceito de cidadania, é considerado a mais acabada proposta do governo para as crianças e os adolescentes do país, pois responsabiliza a família, a sociedade e o Estado pelo cumprimento ou não dos direitos e deveres que lhes são cabidos. “O art. 5º assim determina, que nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei, qualquer atentado por ação ou omissão aos seus direitos fundamentais.” No entanto, observa-se que, “[...] embora tenha feito avançar de modo significativo a discussão sobre as políticas de juventude, o ECA jogou para uma zona nebulosa a discussão sobre os direitos dos jovens que atingem a maioridade legal” (KERBAUY, 2005, p. 201).
Apesar de tudo, nos últimos cinco anos o tema da juventude foi enfim inserido na agenda pública, no Brasil, especialmente no que diz respeito a problemas que mais diretamente afetam os jovens: saúde, violência e desemprego, e na consideração do jovem como protagonista ativo na implementação desses programas. Segundo Rua (1998), as políticas públicas em geral, e especificamente as políticas juvenis, no Brasil, são fragmentadas, estão à mercê da competição interburocrática, padecem da descontinuidade administrativa, agem em resposta a certas ofertas e não a demandas específicas, e revelam as clivagens entre a sua formulação e sua implantação. Acrescente-se a isso, o fato de que o governo não tem uma proposta clara do papel dos jovens no modelo de desenvolvimento adotado no país. Além da expansão das possibilidades de acesso ao sistema escolar e aos projetos voltados para segmentos específicos (jovens excluídos ou em “risco social”), torna-se evidente a ausência de canais de interlocução com os próprios jovens, destinatários de algumas das propostas, mas jamais tidos como parceiros relevantes em seu desenho, implementação e avaliação (SPOSITO, 2003, p. 66).
O senso comum, no entanto, continua representando a juventude de modo negativo, por meio de estigmas e de estereótipos. A depender do contexto sociopolítico e econômico do qual se originam, os jovens são considerados perigosos, marginais, alienados, irresponsáveis, desinteressados ou desmotivados, e cada vez mais relacionados à violência e aos desvios de conduta (os meninos de rua, os arrastões, o surf ferroviário, as gangues, as galeras e os atos de vandalismo).
Para Abramo (2000), a caracterização do comportamento dos jovens como estando propenso a um desvio no processo de integração social retoma elementos que foram comuns na avaliação feita na década de 50, ou seja, a formação de culturas juvenis antagônicas à sociedade adulta. Desta perspectiva, “O desafio é reorientar as políticas de juventude na direção de um modelo de jovem cidadão e sujeito de direito que deixe paulatinamente para trás enfoques como o do jovem-problema que ameaça a segurança pública” (BANGO, 2003, p. 48).
Em nosso país, há ainda um longo caminho a percorrer no sentido de transformar em políticas públicas as políticas de governo para a juventude: políticas públicas constituídas e implementadas a partir de um espaço público que contemple o Estado e a sociedade civil, abandonando a lógica das políticas estatais. Para tanto, torna-se necessário romper com a setorização das políticas de juventude, romper com a visão estigmatizada ou utilitarista da condição juvenil, estimular uma melhor relação entre a sociedade civil e os jovens, promovendo a participação dos jovens na construção de sua cidadania. Não se pode negar que os jovens se mobilizam em função de mudanças; embora seja uma minoria. Para Novaes (2000) é positiva a participação da juventude, pois “[...] através de atividades culturais e experimentos sociais, podemos trazer para a agenda pública a questão dos sentimentos e contribuir para mudanças de mentalidade [...]” (NOVAES, 2000, p. 54). A participação se caracteriza por uma força de atuação consciente, força pela qual os jovens “[...] membros de uma unidade social reconhecem e assumem seu poder de exercer influência na determinação da dinâmica dessa unidade, de sua cultura e de seus resultados” (MIRANDA, 2003, p.23).
Nos anos 1960 e 1970 a participação da juventude fez-se notar pelos movimentos de contestação, nos movimentos de contracultura, e nos anos 1980 podemos citar, por exemplo, o movimento social que ficou conhecido como as “Diretas Já”, que foi um marco significativo da participação da juventude; demonstrando ao Estado brasileiro a força, a determinação e a vontade de mudança dessa parcela da sociedade brasileira. Assim, a partir de 2004, o governo brasileiro cria a Secretaria Executiva de Políticas Públicas para a Juventude, e esta está vinculada ao Gabinete da Presidência da República.
No Congresso Nacional também foi criada Comissão Especial destinada a acompanhar propostas de políticas para a juventude. A partir de 1º de fevereiro de 2005, o Brasil dá passo significativo na construção efetiva das políticas públicas para a juventude. O presidente da República criou, nessa data, o Conselho Nacional de Juventude, a Secretaria Nacional de Juventude e o ProJovem, cujo objetivo primeiro é o de elaborar e implantar política voltada para a população de mais de 34 milhões de pessoas de 15 a 24 anos de idade. Essa iniciativa desencadeou outras em nível regional e estadual. O governo federal instituiu ainda programas sociais com ações voltadas para a juventude numa perspectiva intersetorial, tais como: Programa Saúde do Adolescente e do Jovem (Ministério da Saúde); Programa Especial de Treinamento (PET- Ministério da Educação), Prêmio Jovem Cientista (Ministério da Ciência e Tecnologia); ProUni; Proteção Social à Infância, Adolescência e Juventude, Cultura, Identidade e Cidadania e outros. Em 5 de setembro de 2007, o governo federal lançou programa unificando os já existentes: Agente Jovem, Pró-Jovem, Saberes da Terra, Consórcio da Juventude, Juventude Cidadã e Escola da Fábrica, em um único programa sob a denominação de ProJovem e pretende triplicar o número de atendimentos. O Programa ficará, então, dividido em ProJovem Urbano, ProJovem Campo, ProJovem Trabalhador e ProJovem Adolescente (PRESIDÊNCIA, 2008).
Com a unificação, o governo pretende atender, até 2010, quatro milhões de jovens com idade entre 15 e 29 anos, todos em situação de vulnerabilidade social, e possibilitar que eles sejam reintegrados ao processo educacional, recebam qualificação profissional e tenham acesso à cidadania e ao lazer são políticas para a juventude. Da mesma forma alguns Estados federativos, pressionados pelas ONGs, por movimentos estudantis, por grupos religiosos e por outros, iniciam a trajetória na construção de políticas que promovam a juventude (MTE, 2008).
Segundo os Ministérios do Trabalho e do Desenvolvimento, em 2008 destacam-se os avanços nos programas públicos de emprego e renda para os jovens, trata-se justamente de programas decorrentes da unificação no ProJovem. Cabe ressaltar que, os programas e projetos, em sua maioria, continuam, na prática, fragmentados nas diversas áreas de atividades públicas (LEON, 2008).
O Grupo Interministerial composto por 19 ministérios e coordenado pela Secretaria Geral da Presidência da República, criado em 2004, fez um levantamento dos principais programas federais voltados para esse segmento da população e realizou um diagnóstico da situação dos jovens brasileiros, definindo a Política Nacional da Juventude.
6. MERCADO DE TRABALHO OU EDUCAÇÃO?
Salienta-se que o declínio das oportunidades de trabalho, justamente com o aumento da violência e da pobreza sobre o expressivo contingente de jovens na América Latina está levando-os à ausência de perspectivas em relação ao futuro. A maioria dos jovens são vítimas de situações sociais precárias, sem possuírem as condições materiais básicas para suprir suas necessidades, e, portanto, para garantir a construção da própria cidadania.
Assim, as pesquisas e os debates interdisciplinares colocam o tema juventude na pauta das ciências no início do século XXI e incitam à imediata intervenção na realidade juvenil no continente latino americano.
As políticas públicas são improvisadas, sazonais e desarticuladas entre si. Decorre daí que “Há necessidade de um enfoque multidimensional devido à multiplicidade de fatores que interagem ‘formando complexas redes causais’” (WIRSIG; WERTHEIN, 2002, p. 9).
A violência sofrida pelos jovens é desencadeada pela vulnerabilidade social e pela ausência de acesso às estruturas de oportunidades disponíveis nos campos da saúde, da educação, do trabalho, do lazer e da cultura. Desse modo, as condições socioeconômicas desfavoráveis fomentam o aumento e da criminalidade. Nessa direção, observa-se a necessidade de que as políticas públicas sejam contínuas e permanentes e não como ocorre, fragmentadas e parciais. A Rede de Informação Tecnológica Latino-Americana - RITLA (2008, p. 1), no terceiro Relatório de Desenvolvimento Juvenil, versão 2007,
[...] que realizou um extenso cruzamento de dados do IBGE e dos ministérios da Educação e da Saúde e chegou a algumas conclusões alarmantes. Por exemplo, segundo o relatório, nada menos que 53% dos 35 milhões de jovens entre 15 e 24 anos no país não freqüentam salas de aula. Além disso, 19% deles não trabalham nem estudam, uma porcentagem grande, que fica maior ainda quando se analisa apenas as classes mais pobres: 34%!
Nesse cenário é fundamental investir na socialização da juventude, no combate à vulnerabilidade social pela ampliação dos estoques de capital social, fator que requer mudanças na percepção dos gestores públicos para formular políticas sociais na construção de uma sociedade mais justa (WIRSIG; WERTHEIN, 2002).
Por um lado, muitos pesquisadores e gestores consideram fundamental postergar o ingresso dos jovens no mundo do trabalho para permitir a permanência na escola, favorecendo a aquisição de diplomas escolares de nível mais alto, que permitam acesso a postos de trabalho mais interessantes, tanto em termos de remuneração como de possibilidade de realização pessoal. Por outro lado, considerando os intensos processos de transformação produtiva e de mudança social pelos quais passam as sociedades contemporâneas, a maior escolarização tem representado uma promessa de ingresso a melhores postos de trabalho que nem sempre é garantida. (TOMMASI, 2005, p. 2).
Na pesquisa Perfil da Juventude Brasileira, citada por Tommasi (2005, p. 3), o trabalho é apontado pelos jovens pesquisados como a segunda preocupação, logo após a segurança, esta como o primeiro problema que hoje aflige o Brasil. Nessa direção, “O trabalho é também indicado em primeiro lugar entre os direitos mais importantes para o cidadão, assim como entre os direitos que os jovens deveriam ter, na opinião dos entrevistados”. Apesar de os jovens apontarem o direito ao trabalho como preocupação central em suas vidas, entre gestores e pesquisadores não existe um consenso sobre o reconhecimento desse direito e a necessidade de criar uma legislação específica que regule a questão. Por um lado, já que as noções de juventude e de adolescência ainda estão bastante imbricadas, é difícil afirmar um direito que parece contradizer o que é afirmado no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que proíbe o trabalho para os menores de 14 anos e que regulamenta, de forma bastante severa o trabalho para os menores de 18 anos (FREITAS apud TOMMASI, 2005, p. 3).
Os resultados da pesquisa sobre a juventude brasileira e democracia revelaram algumas facetas da relação dos jovens com o mundo do trabalho. Observou-se que 60,7% dos entrevistados informaram não estar trabalhando. Nota-se que, “[...] o sexo, a faixa etária e a classe social são todas variáveis que influem sobre a possibilidade de ingresso no mercado de trabalho: as moças, os mais jovens e os mais pobres estão numa evidente situação de desvantagem.”. Outro ponto de destaque é a influência do nível de escolaridade: Enquanto somente 33,1% dos jovens com ensino fundamental declararam estar trabalhando, esta porcentagem chegou a 52,4% entre os jovens com ensino médio completo ou mais. A cor da pele também é uma discriminante: enquanto 41,5% dos jovens brancos declararam estar trabalhando, essa porcentagem desceu para 37,9% entre os negros. Dos jovens que informaram não estar trabalhando, 62,9% disseram estar à procura de trabalho. As desigualdades de classe social ficam evidentes quando se observa que 69,5% dos jovens das classes D/E estavam procurando trabalho, enquanto 49,6% das classes A/B se encontravam na mesma condição. Também é significativo o número de jovens da classe C que afirmou estar à procura de trabalho um total de 65,6%. As desigualdades se confirmam quando o assunto é o tipo de escola frequentado pelos jovens: dos que estudaram em escola pública, 66,7% estavam procurando trabalho, enquanto apenas 42% dos que estudaram em escola privada se encontravam na mesma situação (TOMMASI, 2005, p. 4).
Neste panorama, destaca-se a procura frustrada por trabalho e os obstáculos a serem superados pelos jovens. Por mais que esses obstáculos estejam concentrados em determinados segmentos da população: os mais pobres, os negros, os moradores de favelas e de periferias urbanas e as jovens mulheres. Os jovens que conseguem colocação no mercado de trabalho, são expostos à precariedade: “30,5% são empregados com carteira assinada e 44,6% são empregados sem carteira assinada, trabalhadores por conta própria ou autônomos sem vínculos com a Previdência Social.” Por sua vez, os jovens aprendizes “são 6,4% e somente 4,4% são autônomos com vínculo com o INSS. Os jovens empregados sem carteira assinada das classes A/B são 16,1%, mas o percentual chega a 33,8% entre os das classes D/E.” Nesse sentido, a pesquisa apontou vulnerabilidade nas relações de trabalho a que são submetidos os jovens das classes mais pobres (TOMMASI, 2005, p.3).
A situação dos jovens pesquisados com respeito ao estudo e ao trabalho é a seguinte: 25,9% só trabalham; 33,6% só estudam; 13,4% trabalham e estudam e um número expressivo 27,1% nem trabalham nem estudam. Segundo Tommasi (2005, p. 4), “[...] dentre os jovens que estiveram presentes nos Grupos de Diálogo (913), a faixa de idade entre 21 e 24 anos foi aquela em que se registrou o maior número de jovens ocupados em todas as regiões.” Neste contexto observou-se que “[...] nessa faixa etária as pessoas têm maiores oportunidades de ocupação do que em faixas mais jovens. Considerando a relação dos jovens participantes dos grupos de diálogo com o trabalho nas sete regiões metropolitanas investigadas e o Distrito Federal, a taxa de ocupação foi de 34%.”
As desigualdades regionais são significativas, pois, enquanto a região mineira registrou a maior proporção de jovens ocupados (54,9%), a região de Recife registrou a menor (27,4%). Nos Grupos de Diálogo, o trabalho apareceu entre as principais preocupações dos jovens. No Distrito Federal, em São Paulo e em Porto Alegre, ocupou o primeiro lugar entre os temas que mais preocupam os jovens; em Belo Horizonte, no Rio de Janeiro e em Salvador apareceu em segundo lugar e, em Recife e em Belém, em terceiro lugar, atrás de violência e de educação. “Tudo que queremos é emprego!” Fala de uma jovem da Região Metropolitana do Recife (TOMMASI, 2005, p. 4).
Segundo Tommasi (2005, p. 4), sobre o que preocupa os jovens em relação ao trabalho, foram apontadas as seguintes variáveis: mercado de trabalho restrito; conseguir o primeiro emprego; a falta de qualificação profissional adequada e enfrentar preconceitos. “Uma reclamação recorrente é quanto à incoerência do mercado, que cobra a tão falada ‘prática profissional’ daqueles que estão justamente demandando a sua primeira oportunidade de emprego, evidenciando a insuficiência das políticas de incorporação dos jovens ao mercado de trabalho.”
Pode se observar no estudo de Tommasi (2005) que os jovens se mostram confiantes na possibilidade de as empresas ampliarem as oportunidades de emprego para eles. Sugerem o estabelecimento de parcerias e de convênios entre o governo e as empresas, e os incentivos fiscais aos empregadores para que abram postos de trabalho para os jovens sem experiência. Importante destaque está na confiança que sentem na solução das questões por parte do Estado, e na superação dos obstáculos advindos da falta de experiência e de qualificação e pela discriminação também que podem estruturar suas vidas e trabalho a partir do conhecimento.
Os jovens anseiam por qualificação profissional, e não levam em conta a reestruturação econômica e as mudanças nas formas de produção que influenciam fortemente sobre a diminuição das vagas e sobre a precarização das condições de trabalho. A demanda por mais e por melhor capacitação profissional foi central nas discussões durante os diálogos. O aumento das oportunidades de qualificação profissional e a adequação entre a oferta de qualificação e a demanda por trabalhadores qualificados existente no mercado foram reivindicações centrais nas falas dos jovens, que acreditam que seja possível regular melhor a oferta e a demanda por empregos. A importância de cursos mais direcionados à profissionalização, que complementem a formação escolar, evidenciou-se na Pesquisa de Opinião: 66,5% dos jovens entrevistados declararam participar de algum tipo de atividade de natureza extraescolar.
A maior incidência entre as classes sociais encontra-se em cursos de informática/ computação (44,1%), profissionalizantes (19,3%), esportivos (15,4%) e de língua estrangeira (11,6%), ou mesmo aqueles relacionados com atividades culturais (música, teatro, artes plásticas, danças e outras) que, segundo alguns jovens, também podem servir como cursos de profissionalização na área da arte e cultura. É menor, no entanto, a participação dos jovens mais pobres, dos negros e dos de baixa escolaridade nesses espaços de formação complementar. Essa situação testemunha que a desigualdade educacional se manifesta também no acesso às oportunidades de complementação formativa, oportunidades que se encontram disponíveis de forma mais abrangente e qualificada para jovens brancos e oriundos das classes de maior poder aquisitivo (TOMMASI, 2005, p. 4).
Sobre a demanda de trabalho, os estágios são apontados como estratégia de sobrevivência imediata, na tentativa de superar as exigências do mercado de trabalho. Essa oportunidade não é, no entanto, repartida igualitariamente entre as classes sociais, pois é accessível para os jovens de classe social mais elevada. Em todas as regiões os jovens verificaram sentimentos discriminatórios no processo de, na busca pelo primeiro emprego, sentimentos referentes à aparência e às praticas de racismo contra os jovens na sua forma de vestir e de se comportar. Na pesquisa “Perfil da Juventude Brasileira”, os jovens indagados sobre os principais conceitos associados ao trabalho, indicaram: necessidade (64%), independência (55%), crescimento (47%) e autorrealização (29%) (ABRAMO, BRANCO, 2005). Diante disso, no próximo item busca-se explorar as ações públicas relacionadas aos jovens, ações que, geralmente, são sem integração e sem continuidade.
Segundo Pereira (2007), o trabalho remunerado deixou de ser característica exclusiva da sociedade de mercado e tem se tornado também uma das principais formas de atuação social para a criação ou a reprodução de novas unidades familiares autônomas e independentes.
Isto se aplica, sobretudo, à faixa jovem da população com desejo de conquistar independência em relação aos pais, ou realizar a transição segura para a vida adulta com pleno acesso a trabalho remunerado, a educação, a saúde, a lazer e, ao menos minimamente, vida protegida da sanha de narcotraficantes. Acrescente-se também a necessidade de "transição segura para a vida adulta" com a constituição de novas famílias casando-se ou amasiando-se. Pesquisas recentes têm mostrado, no entanto, a existência de um desemprego estrutural e defasagem educacional que atingem os jovens, sobretudo, os das classes trabalhadoras, entre eles os de origem rural. Numa população de 33,85 milhões de jovens entre 15 e 24 anos no Brasil, 19% não trabalhavam nem estudavam em 2003. Quando se faz o recorte para os negros e para as mulheres jovens, esse percentual sobe para 21% e 26%, respectivamente (IBGE, 2003; PNAD, 2003; IPEA, 2005). Ainda outra pesquisa (Perfil da Juventude Brasileira) ─ encomendada pelo Instituto Cidadania, Instituto de Hospitalidade e Sebrae ─ revela que, entre novembro e dezembro de 2003, 32% dos jovens entre 15 e 24 anos já haviam trabalhado, mas atualmente estavam desempregados e outros 24% nunca haviam trabalhado, mas estavam procurando emprego. Passados três anos, já em 2006, os índices de desemprego entre os jovens não só permaneceram altos, mas também aumentaram em relação a 2003.
De acordo com o Dieese, em setembro de 2006, o desemprego entre os jovens era de 31,8%, o que corresponde a quase o triplo do existente entre as pessoas com 25 anos ou mais que é de 12,7%. Além disso, a grande maioria dos jovens não consegue conciliar trabalho e estudo. Cerca de 70,1% dos jovens ocupados, em São Paulo, não estudam (PEREIRA, 2007, p. 4). Pochmann (2007) observa que a quantidade de jovens desempregados em 2005 era cerca de 107% superior a de 1995. Nesse sentido, está armado um grande problema social, problema que exige ação imediata dos formuladores de políticas públicas, governantes e, por que não, de toda a sociedade civil (governos, organizações de classe, movimentos sociais, partidos políticos, igrejas, entre outros). É preciso combater fortemente o desemprego e viabilizar condições para que os jovens empregados também possam estudar e ter lazer.
Trabalho e autonomia: esses dois fatores estão na base de transição para a vida adulta entre os jovens. Se, no entanto, considerarmos aqueles altos índices de desemprego e a situação propícia que se cria para o envolvimento com o uso de drogas e de entorpecentes, bem como o retardamento na constituição de novas famílias autônomas, pode-se afirmar que um dos grandes problemas sociais para a juventude, hoje, é a dificuldade da transição segura para a vida adulta (PEREIRA, 2007, p. 10).
Procurando escapar dessa problemática, milhares de jovens, em todo o mundo, principalmente das áreas rurais e inclusive no Brasil, têm feito migrações em busca de trabalho e de melhores condições de vida. A intensidade dessas migrações é tamanha que a Organização das Nações Unidas (ONU) prevê que, em 2008, o número de habitantes das cidades será maior que o número de habitantes das áreas rurais. E onde irão morar os jovens migrantes? A ONU prevê que irão morar em favelas com habitações precárias, sem água tratada, sem saneamento básico, sofrendo altos índices de desemprego e/ou com empregos precários, incapazes de garantir-lhes a transição segura para a vida adulta.
Esse cenário se configura como um problema social que se acentua com as constantes reestruturações do capitalismo baseadas no uso predatório de tecnologias e em cortes de verbas para políticas sociais, bem como um problema de governos federais, estaduais, municipais, das associações em geral, entre outros grupos coletivos de pressão. Um ponto de partida é politizar a discussão sobre juventude e sua transição segura para a vida adulta nos grupos de jovens, nas escolas, nas associações, nas reuniões de bairros e de amigos, nas câmaras municipais, e torná-las prioridades nas agendas políticas municipais, estaduais e internacionais, criando melhores condições de vida no campo e na cidade.
Diante disto, o presente estudo pretende observar sua operacionalização diante da construção de desafios para as políticas públicas educacionais, em que é possível programar ações imperativas, relacionadas à vulnerabilidade, à violência e à exclusão da juventude no Brasil, visando a uma socialização política voltada para o incremento dos índices de capital social e de empoderamento.
7. EDUCAÇÃO E EMPODERAMENTO
Os setores dominantes da sociedade brasileira sempre se empenharam na negação do direito à educação à maioria da população, não só por não garantirem acesso à educação, mas também por preconizarem uma educação restrita aos interesses da elite.
As finalidades e os objetivos gerais da educação nacional estão expressos em leis específicas. A Lei Federal nº 4.024/1961, denominada Lei de Diretrizes e Bases da Educação, foi posteriormente alterada pelas Leis Federais nº 5.540/1968 (que aborda especificamente o ensino superior), nº 5.692/1971 e nº 7.044/1982 (que alteraram as diretrizes e normas de ensino de 1º e 2º graus). A Constituição Federal de 1988 deu novas perspectivas ao sistema escolar e a seu funcionamento, sendo então promulgada, em 1996, a nova LDB, publicada como Lei Federal nº 9.394/1996. Depois, em 2001, foi publicado o Plano Nacional de Educação, que trata basicamente da gestão da escola.
Segundo o artigo 205 da Constituição Federal, a educação é direito de todos e dever do Estado e da família ─ será incentivada e promovida com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Conforme Costa (2005), a escola deveria funcionar como mediadora da interação social, uma vez que propaga valores de interação entre os alunos, sendo assim o local preferencial de ensino, embora esse possa ser realizado em múltiplos locais e meios. Apesar da existência de leis e de normas de atenção à juventude, percebe-se que as políticas públicas apresentadas para a juventude não são políticas da juventude e sim políticas para solucionar possíveis dificuldades, ou seja, para tratar de problemas que alguns membros dessa parcela da sociedade apresentam, e são políticas, em sua grande maioria, para conformar essa população às normas vigentes, sendo que a escola tem funcionado como instrumento eficaz dessa conformação.
Assim sendo, essas políticas são quase nulas, pois excluem os jovens do processo decisório/educativo e político. O que se propõe como política adequada é que a juventude deve não apenas fazer parte de uma política pública, mas também de participar, propondo, discutindo e ajudando a programar as políticas.
Assim, políticas públicas da juventude devem possuir componentes amplos e inter-relacionados, que não podem ser traçados de forma isolada, sob pena de não se produzirem de fato, pois “[...] as políticas públicas para os jovens, só se caracterizam como tal, se refletir as condições específicas da juventude, e advir de pautas que realcem a capacidade e a participação política dos mesmos” (ARAUJO, 2007, p. 62).
O processo de ensino/aprendizagem, nesse contexto, possui importante representação, pois deve ser compreendido na perspectiva da não-transmissão de um conhecimento especializado, do qual os profissionais da educação são detentores para uma população leiga, cuja vivência diária é desvalorizada ou ignorada. Não se deve impor o conhecimento de alguns, acreditando que a população venha a desaprender o que é vivido na prática cotidiana para incorporar o novo aprendizado.
A falta de educação não é um problema possível de ser solucionado individualmente, mas, se somam a ele elementos coletivos, técnico-científicos, respeito à cultura e ainda a necessidade de absorver o conhecimento ora exposto e incorporá-lo ao cotidiano.
Assim, trabalhar com a noção de que educação envolve o conjunto dos processos pelos quais os indivíduos se transformam em sujeitos de uma cultura, reconhecendo que existem muitas e diferentes instâncias e instituições sociais envolvidas com esse processo de educar, algumas delas explicitamente direcionadas para isso, enquanto que, em outras, esse processo educativo não é tão explícito e nem institucional (COSTA, 2005). Pode-se constatar que programas focalizados em temas variados, como drogas (inclusive álcool e tabaco), práticas sexuais desprotegidas, gravidez na adolescência, nutrição ou trânsito, etc. são muito eficientes em aumentar conhecimentos, têm alguma eficiência em mudar atitudes e, com raras exceções, são ineficientes na mudança de práticas relacionadas à saúde (MEYER et. alii, 2006, p. 4).
Conforme Meyer et alii (2006), as mudanças de comportamento são produtos muito raros do processo educativo já implantado e, mais do que isso, constata-se que as múltiplas dimensões que interagem nos ambientes onde transcorre a vida tornam muito difícil vincular diretamente as atividades da educação aos componentes que emergem do tempo. Para tal, observa-se que uma educação voltada para a ampliação da cooperação social poderia colaborar para promover índices favoráveis de capital social e de empoderamento nos jovens. O pressuposto essencial é o de que o capital social é gerado por redes de confiança, rede que proporcionam previsibilidade nas relações e promovem indicadores de empoderamento nos jovens.
Misztal (1998, p. 11) coloca que a confiança é uma condição necessária para se manter a ordem social. Assim, “a confiança pode ser definida como mecanismo de solução para o problema da cooperação”, além disso, cria condições para o desenvolvimento da solidariedade, da tolerância e da legitimação do poder. A confiança nos outros é importante para sustentar a ordem coletiva, pois pode produzir um sentimento de eficácia política na participação democrática.
As ciências sociais inicialmente abandonaram as noções de obrigações morais, assim confiança e solidariedade foram consideradas irrelevantes. “Mas o debate reaparece sobre a nova ordem industrial, na qual a confiança é valida como um recurso para aliviar o atomismo individualista da sociedade moderna” (MISZTAL, 1998, p. 1-2). O argumento central é que as regras de confiança entre comunidade e o governo são essenciais para a efetiva responsabilidade das instituições. Observa-se, também, que as teorias aliadas ao capital social revitalizam a ideia de sociedade civil como base na coesão social, pois o critério de confiança moderno tem uma racionalidade diferente dependendo das crenças morais de cada sociedade, que tem suas próprias bases de valores e de crenças culturais.
Analisa-se a confiança interpessoal que envolve os relacionamentos cotidianos e a confiança nas pessoas, envolvendo as relações com os membros da família, com amigos, com professores, com vizinhos, entre outros grupos de referência para os indivíduos. Por isso é mais difusa que a confiança institucional.
Por sua vez, a confiança institucional é relacionada à credibilidade das instituições políticas, econômicas e sociais. Ambas fazem parte da confiança social, que, para Durkheim, gera cooperação e alimenta mais confiança. A principal força que desencadeia o crescimento dos índices de capital social em uma comunidade pode ser verificada nas relações de confiança social. Estudos apontam , no entanto, a redução dos níveis de confiança em todo o mundo. Os jovens brasileiros apresentaram baixos percentuais de confiança. Nesse sentido, políticas públicas de intervenção no sistema educacional brasileiro podem contribuir para reverter esse quadro e promover indices positivos de capital social e aprimorar a governança.
Sabe-se, no entanto, que os principais agentes educacionais são os professores, pois são ao mesmo tempo responsáveis por uma mudança nos rumos da educação, assim como também são vítimas da própria dinâmica imposta pelo sistema e pela precarização do ensino público.
O conceito de empoderamento vem sendo utilizado para expressar a aquisição de uma consciência coletiva da dependência social e da dominação política, traça uma ponte entre o local e o global, ampliando o contexto de inserção do indivíduo para além da sua realidade/comunidade, articulando com noções mais amplas de participação política. O empoderamento traz, embutido em si, componente de transformação da realidade, pois é um processo que envolve elementos individuais e coletivos. Sendo assim, é a possibilidade de compreensão a respeito da realidade de seu meio social, político, econômico, ecológico e cultural, refletindo sobre os fatores que dão forma a seu meio ambiente, bem como sobre a tomada de iniciativas no sentido de melhorar a própria situação.
Assim, empoderamento abrange não somente participação, pois inclui tomada de decisão, inclui controle por parte de quem não detinha nenhum poder quanto às políticas que lhe diziam respeito, inclui sair da condição de objeto de uma política para assumi-la de uma posição crítica e ativa ao longo do processo decisório.
É preciso mobilizar o jovem e oferecer a ele condições para uma atuação construtiva, mobilizando-o para a verdadeira cidadania, pois empoderamento traz consigo os componentes de transformação da realidade, sendo então um processo que envolve elementos individuais e coletivos.
Dessa forma, cidadania então pode ser compreendida como produto de histórias sociais protagonizadas pelos grupos sociais. Ela é entendida abrangendo os direitos civis do cidadão como portador de direitos e de deveres, além de considerá-lo criador de direitos e de deveres, condições que lhe possibilitam participar da gestão pública.
Cidadania demonstra uma tomada de consciência da população que vem, pouco a pouco, ganhando terreno, adquirindo uma postura renovada, saindo da posição daqueles que recebem soluções/respostas prontas do Estado para uma nova realidade, onde o cidadão, de forma responsável e consciente, participa da estrutura da realidade; buscando existência digna para todos, com trabalho, lazer, educação, saúde, meio ambiente equilibrado, entre outras necessidades humanas. “O povo tem direito, numa democracia de verdade, de participar do governo, e não apenas de esperar os resultados dele” (MOTTA e DOUGLAS, 2000, p. 54).
O exercício da cidadania é facilitado pela existência de instâncias que promovam a defesa dos interesses do cidadão (jovem) nas relações com órgãos públicos, privados e ONGs. Desta maneira deve-se pensar em uma educação para a cidadania, onde a socialização das informações, o envolvimento na tomada de decisão dentro de um processo de diagnóstico, planejamento e a execução dos projetos e iniciativas sociais são fundamentais.
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A maioria dos jovens busca, na formação profissional, no trabalho e na renda, condições para o mínimo de melhoria da qualidade de vida, assim como, paradoxalmente, a própria busca por trabalho exige dispor de recursos mínimos para transporte e para alimentação, que nem sempre estão ao alcance dos jovens. Outra dificuldade dos jovens que trabalham é o descumprimento da legislação trabalhista: trabalho mal remunerado, sem carteira profissional assinada, falta de pagamento das horas extras, entre outros. Quanto ao trabalho voluntário, alguns jovens reconhecem que o mesmo pode ampliar as possibilidades de contato e de acesso ao mundo do trabalho, porém outros explicitam claramente que a existência do trabalho voluntário é um obstáculo para a ampliação dos postos de trabalho, ou seja, voluntários estariam ocupando vagas de trabalhadores remunerados.
Como para a maioria dos jovens o trabalho representa uma vida melhor, compreende-se a busca excessiva por oportunidades de trabalho e ainda sua preocupação quanto ao desemprego juvenil, que é três vezes maior, comparado com o desemprego do restante da população ativa. O desemprego aflige os jovens, pois interrompe um percurso de conquista progressiva da autonomia, da transição para a vida adulta e da emancipação econômica.
Quando os jovens se deparam com a realidade excludente do mercado de trabalho, dão início a um processo doloroso de desmascaramento de algumas promessas de inclusão, pois percebem que a conquista de uma escolaridade longa (avanço em relação à geração de seus pais, e ainda os programas que objetivam postergar o ingresso dos jovens no mundo do trabalho) não surtem os efeitos esperados da abertura efetiva de vagas para eles.
Segundo Nazzari (2006b), a falta de engajamento dos jovens em movimentos sociais, estudantis e na comunidade, essa falta de engajamento faz com que eles não se sintam eficazes para demandar políticas públicas que os beneficiem. Essa falta de engajamento faz, também, com que eles não assumam sua identidade nem se transformem em sujeitos da construção social de sua realidade. Nesse sentido, a escola pode estar falhando, enquanto proposta de empoderamento dos jovens, comprometendo a possibilidade de construir normas e crenças de valorização da cidadania, bem como pode não estar contribuindo para a geração de identidades coletivas sólidas entre os alunos e a instituição (BAQUERO e BAQUERO, 2005).
Existe, contudo, uma grande parcela de jovens que também necessitam de políticas públicas para si, pois seu espírito criativo e dinâmico é a garantia da transformação social. Toda a energia própria desse período da vida precisa ser potencializada, a fim de provocar as mudanças significativas em suas realidades, ou seja, os jovens necessitam ser empoderados por meio de políticas públicas afirmativas.
Os resultados das pesquisas não são alentadores no que diz respeito aos jovens e ao mercado de trabalho no Brasil, no entanto os jovens continuam aguardando uma resposta do Estado para suas demandas. As imagens que os jovens têm das instituições públicas e de seus representantes, preponderantemente negativas, não se constituem, porém, em elementos que nos deem segurança de que o futuro será melhor para eles.
Intersetorialidade significa ações articuladas e coordenadas, utilizando e disponibilizando os recursos existentes em cada setor de forma eficaz, direcionando-os para ações que obedeçam a uma escala de prioridades estabelecidas em conjunto. Recursos dispersos e aplicados, sem um planejamento global, são mais facilmente desperdiçados ou utilizados por grupos isolados para seus interesses particulares. Esta é uma premissa básica da política consistente de atenção à juventude. Enquanto os diferentes setores do governo e da sociedade civil agirem isoladamente, não se terá uma política efetiva para a juventude.
Nessa direção, enfrentar o desafio de se posicionar sobre os mecanismos que são fundamentais na promoção do protagonismo dos jovens brasileiros apresenta-se como ferramenta essencial para a superação dessa condição da juventude presente.
Assim, faz se necessário fomentar ações coletivas nas escolas, nos grupos de convivência e também na família. Tais esforços levam à constituição de redes baseadas na confiança recíproca, na solidariedade e na constituição de raízes que poderão, em longo prazo, ser importantes na configuração de uma cultura juvenil igualitária e libertadora.
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